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Arte da fuleragem, termo cunhado pelas mentes criativas de artistas plásticos e cênicos liderados pela Profª Drª Bia Medeiros do Instituto de Artes da Universidade de Brasília.
Com uma produção intensa, cujos trabalhos estão presentes em muitas das principais exposições de arte e tecnologia, artes plásticas e performance do País, o Corpos vem se firmando há duas décadas como uma referência no conceito de arte e tecnologia. O registro audiovisual; a manipulação de imagens e a utilização de novas tecnologias de informação e comunicação tais como as redes sociais e a pesquisa sobre técnicas de tele-presença são atividades corriqueiras nos projetos do Grupo.
Composto por uma dezena de artistas, o Corpos Informáticos utiliza espaços públicos e de exposição para mostrar suas criações que utilizam uma variedade incrível de recursos e linguagens para mostrar sua arte. A performance, no entanto, é a forma de expressão artística mais utilizada e que guarda a predileção de seus integrantes. Salta aos olhos o dinamismo do processo de criação do grupo que acontece delineado num percurso curioso.
Grupo de Pesquisa CORPOS INFORMÁTICOS
coordenação: Professora Doutora Maria Beatriz de Medeiros
Pesquisadores: Alice Stephanie, Carla Rocha, Frederick Sidou, Gisele Alvarenga, Katiana Donna, Maria Luiza Taunay, Milton Marques, Ramon Sodoma, Robiara Becker.
"O questionamento que norteia a pesquisa do Grupo CORPOS INFORMÁTICOS, por mim coordenado, refere-se à relação homem-máquina, à secante corpo/novas tecnologias sendo estas últimas tomadas como fundadoras do organismo simbólico do indivíduo contemporâneo. Pensamos em um equilíbrio para o sistema ecológico deste organismo simbólico, agora, em acelerada modificação permanente.
O corpo animal do homem questiona a efficaci®realidade do universo tecnológico. O corpo é o sujeito, e o maior objeto, das novas tecnologias. Na publicidade, o corpo não é corpo vivo e contraditório. Ele, aí, não é o lugar da “verdade subversiva do desejo”. (1) O corpo veiculado pelos meios de comunicação unidirecional, ditos, de massa, é um corpo “erotizado” com uma significação sexual planificada e calculada, ele é esvaziado do desejo. (Qual desejo? Em meio de comunicação unidirecional não há espaço para uma reflexão imagética, ou teórica, desta ordem). O corpo, aí, não é nem carne, nem sexo, mas objeto transformado em signo por abstração e semiologização: signo com uma função social de troca. Pela valorização destes “corpos”, o indivíduo é levado à se privar de seu corpo orgânico. Obcessão: higiene e asepsia. Corpo-objeto, objeto de culto a ser cuidado, limpo, tratado.
A partir dos anos 20, mas, sobretudo, a partir dos anos 50, o artista plástico torna-se o sujeito da arte e seu corpo objeto. Performances, happenings ameaçam os contornos das artes plásticas. Belas-Artes? As outras linguagens artísticas também trans-bordam. Dois elementos são fios condutores de perturbações: o corpo e o tempo como elemento estético.
“Particularmente, hoje em dia, o real não é mais do que isto: estocagem de matéria morta, de corpos mortos, de linguagem morta.”(2) A linguagem corporal, corpo real, dificilmente se tornará linguagem arcáica e comprometida. O corpo humano e sensual, secreções e contaminações, é processo e efêmero. Por sua opacidade se opõe à “transparência” conceitual, ele é ruptura e revela o indizível, condição da arte, como queremos, com Barthes.
A linha (o desenho, a pintura) têm em si um eco do corpo, “os desenhos são irmãos dos textos em pressão de angústia”(3), então os desenhos são também irmãos dos textos em pressão de prazer. Sobre o papel a linha escorre livre, ela não segue as paralelas do caderno, ela toma toda a página, de cima em baixo, da direita à esquerda. Em desenhos, o gesto se destaca, se desgarra em uma direção onde não podemos surpreendê-lo. Assim estes são irmãos dos textos em pressão de prazer e em intensidade de gôzo. O corpo, desenhando no espaço tridimensional um momento “infinito enquanto dure”(4) e efêmero, não somente com a mão e o braço, mas com todos os seus membros e membranas, não pode ser linguagem, código. Ele desafia e gera descarrilhamento da inteligência, risco de ilimitação, desmantelamento das fronteiras da identidade, enfim, prazer estético.
As teorias filosóficas, assim como a percepção e o senso comum, imobilizam. Pensamos por conceitos durante séculos. Hoje nasce uma compreensão da realidade que nos sensibiliza para o tempo (e para os conceitos) como processo. O aparecimento da ecologia é uma das cconsequências desta nova compreensão. O prazer estético contemporâneo rreivindicao tempo como elemento estético presente nas “artes do tempo”(Gillo DORFLES): performance, happening, instalações efêmeras, vídeo-arte, e computação gráfica. Nas duas últimas existe ainda uma outra linha de reflexão: a espacialidade gerada por cor-luz emitida.
“E se a obra pressupõe a travessia da transitoriedade para buscar o tempo em estado puro ela se colocará, também, do ponto de vista da elaboração, numa situação temporalmente indeterminada, entre dois horizontes, o do começo, numa abertura indefinida para o antes, e o do fim, numa perspectiva indefinidamente aberta para o depois. … o tempo… assumí-lo como meio envolvente, em que se transita e em relação ao qual o começo e o fim não são instantes absolutos mas, respectivamente, paisagem de origem e nostalgia de completude.” (5)
A vídeo-arte possibilita a transcrição de secreções e contaminações se exprimindo em faíscas de prazer, de angústia. Ela pode trazer à tona o corpo-signo energético, signo questionador da positividade tecnológica, efficaci®realidade, deste mídia, a teoria da cor-luz (a ser escrita), o tempo como elemento estético, questões de autoria, de obra única, de imutabilidade de conteúdos… A vídeo-arte, mas sobretudo, o computador pessoal (futura televisão interativa), suporte comunicacional (pluri-direcional), não mais permitirão um retorno à arte estática, duradoura e individual. No entanto, na computação gráfica, o corpo é simulacro deste signo. Que corpo para as redes de comunicação?
O corpo, tornado signo na linguagem videográfica, circulando em mídia digital interativo, deixará sobreviver o risco de ilimitação, de desmantelamento das fronteiras da identidade, ou ainda, que resquícios, que centelhas de hipoícone “sobreviverão” em corpos algorítmicos? Que consequências para a ecologia simbólica dos indivíduos e da sociedade?
__________________
(1) BAUDRILLARD, Jean, “La société de consommation”, Idées/Gallimard, Paris, 1970, p 213.
(2) BAUDRILLARD, Jean, “Oublier Foucault”, Galilée, Paris, 19777, p. 63.
(3) LYOTARD, J.-F., “Dérive a partir de Marx et Freud”, UGE, col. 10/18, Paris 1973, 320pp.
(4) Vinícius de Moraes.
(5) SILVA, Franklin Leopoldo e, “Bergson, Proust. Tensões do tempo”, in NOVAES, Adauto, Tempo e História, pp. 141 à 153, p.152.
Bia Medeiros
Brasília, 1995
Referências:
- http://adautocandidosoares.com/2011/06/24/pura-fulerage-do-grupo-corpos-informaticos/
- http://corpos.blogspot.com.br/2004_10_01_archive.html
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